Caras de Belém

São várias as caras de Belém. Algumas delas estão aqui, a maioria sabe Deus por onde anda.

domingo, 30 de dezembro de 2007

Gente que descobriu o paraíso

Saindo de Belém, logo ali na frente, do outro lado do rio, na Ilha do Cumbú, vive Manuel Pedro Quaresma, 48, casado com quatro filhos e um problema que o atormenta todas as manhãs: “um casal de sabiá que me acorda de manhã bem cedo”, diz Pedro em meio a uma gargalhada. “Viver aqui longe do barulho da cidade grande, sem criminalidade, sem sufoco é um bem que quero para o resto da minha vida”.

O homem com uma aparência saudável e com a pele dourada pelo sol trabalhou com madeira, mas agora tem um restaurante que provoca a gula de muita gente. “Todos os dias de segunda a segunda oferecemos uma comida gostosa, simples e muito caseira, feita pela minha esposa, Sônia”, conta Pedro.O restaurante é freqüentado pelas embarcações que passam diariamente pelo rio Guamá e por gente que gosta de um peixe frito com farinha d’água e curte passeios pela floresta e um café da manhã com a revoada do papagaios, fenômeno que encanta diversos turistas vindos para a nossa região.

Quem tem a oportunidade de estar, mesmo que por poucas horas, nesse lugar sabe que o “seu Pedro” tem razão para esbanjar felicidade.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

O homem dos livros

Alessandro Nicácio só tem dificuldades em dar informações sobre sua vida pessoal. A idade então, é “segredo de Estado”. Mas, quanto à sua profissão, ele não encana. E descobrimos um grande incentivador, não só da leitura, mas dos autores regionais.

Alessandro começa com a boa notícia. Mesmo sem dados concretos, apenas com a percepção diária, garante que houve aumento da procura por livros entre os belenenses. Ele, que há 9 anos vive da venda de livros no shopping Iguatemi, em Belém, fala da importância e dos desafios de trabalhar no ramo. “Um bom vendedor pode fazer um cliente desistir de qualquer outro presente para dar um bom livro”, orgulha-se do desafio.

Alessandro conta que costuma dar “força” aos escritores locais. “Sempre quando alguém pede sugestão, eu falo de algum autor paraense. Ainda é muito tímida a procura por nossos escritores”. A maior surpresa durante quase uma década como vendedor de livros, foi a venda de 450 exemplares do “Relacionamentos que dão certo”, da escritora paraense Angélica Nancy. “Ou ela conhecia muita gente ou o livro é bom mesmo. Em uma noite de autógrafo, conseguiu esgotar os livros”, opina.

Observador, Alessandro garante que sabe “chegar na hora certa”. “Na livraria o cliente precisa respirar, ver as opções que temos. Nada de ficar em cima, tentando adivinhar cada pensamento”. Segundo ele, “bastam alguns minutos observando o ‘passeio’ do cliente pela loja que dá para perceber que tipo de leitor se trata”.
por Bernadeth Lameira

De coco em coco

Final da tarde na Praça Batista Campos. No calçadão, os atletas do dia-a-dia correm contra a balança num saudável balé que reúne tanto jovens quanto membros da terceira idade. Nos coretos, namorados entrelaçam-se, enquanto algumas famílias deliciam-se com pamonhas sentados no banco da praça.

Entre uma volta e outra, um dos corredores dá uma pausa para tomar fôlego em uma das barracas de coco. Lá encontramos Marcos Lielton Machado, 22 anos. Um jovem que trabalha na praça há 15 anos. Ele conta que na realidade vem à praça desde seu nascimento porque sua mãe o trazia quando ia fazer as vendas. Ela trabalhava numa fábrica de calçados, mas o empreendimento fechou e ela teve de partir para outro ramo. Uma amiga ajudou na escolha e assim começou a história da comida típica e cocos na vida de Marcos.

O ponto sempre foi a Praça Batista Campos, mas nem sempre o cardápio incluiu o coco. O fruto foi introduzido após a administração de Duciomar Costa ao decidir padronizar os vendedores e limitar as vendas aos cocos. A mudança reduziu um pouco a renda, mas o coco sobreviveu.
Marcos só tem um lamento em relação à praça que é quanto à segurança. Os assaltos são constantes: de manhã, à tarde e à noite; e isso tem afastado os turistas e frequentadores habituais que caminham cada vez menos no local. O policiamento não é suficiente.

Apesar das dificuldades, Marcos resiste; afinal, tem mulher e precisa ajudar sua mãe. Quanto ao futuro, ele ainda pretende fazer uma universidade, mas não sabe o que cursar. Ele está inscrito no Projovem e termina a 8ª. Série este ano. Enquanto aguarda a universidade, Marcos vai levando a vida à água de coco.
por Cidclay Oliveira.

O almoço da dona Ottelia

Aos 86 anos, dona Ottelia Pignatari Costa deu início a uma nova fase em sua vida. Paulista, mãe de três filhos e avó de seis netos, Ottelia decidiu ceder aos pedidos da filha Cintia para vir morar com ela em Belém. “Minha saúde já não é mais a mesma de vinte anos... Além do mais, a minha convivência com a Benta, minha empregada há 50 anos, estava péssima”, conta.

A filha, Cintia, casada com o paraense Claudio, achou que a mudança para Belém seria o melhor para a mãe. Em agosto, dona Ottelia já estava em companhia da filha, genro e netos. Desde a sua mudança, a família costuma almoçar fora aos domingos e passear. Hoje, dia 9 de dezembro, dona Ottelia e a família foram almoçar no restaurante do Mangal das Garças, um dos mais recentes pontos turísticos da cidade. “É a segunda vez que almoçamos aqui e eu gosto muito. Adoro ver este verde, a vista para o rio, os pássaros... E a comida é muito boa”, comenta. Aliás, os pratos típicos são a preferência desta filha de italianos. “Semana passada, fomos comer peixe no ‘Na Telha’, em Icoaraci”. O que ela não gosta em Belém: o clima.

Mesmo com 86 anos, dona Ottelia é uma senhora muito ativa. Em São Paulo, fazia curso de pintura e hidroginástica. “Já comecei a minha hidro aqui em Belém. Só falta achar um curso de pintura”, diz.
por Thais Coimbra

A espectadora

“Belém ainda é uma cidade boa de se viver. Gosto muito de passear pelas praças, gosto do túnel de mangueira, de ver o cair da chuva, gosto da Cidade Velha, das igrejas, de Mosqueiro, onde passei parte da minha infância. Sempre que recebo meus parentes ou amigos, gosto de mostrar a minha cidade.” Quem fala da cidade onde mora com tanto gosto, quase passa despercebida nos encontros da turma do curso de pós-graduação em jornalismo de revista que acontecem uma vez por por mês, no hotel Regente.

Vestida com elegância discreta, Lena Soares Afonso, profissional autônoma diz que preferia passar os domingos com a filha, mas como precisa defender o orçamento do mês... “Mas não acho muito massante passar esses domingos acompanhando o curso. Apesar de não ser da minha área, estou tendo contato com outras percepções do conhecimento.”

Divorciada, com 48 anos, a mãe da Clara gosta de tomar uma cervejinha nos finais de semana, - que ninguém é de ferro. “Gosto muito do mormaço, do trapiche. Belém tem bares ótimos para a gente se divertir com os amigos”, concluiu a nossa secretária.
Por Ronaldo Quadros

Mórbido plantão

Enquanto uns amanhecem, outros reconhecem a noite. Dor e alegria, cada uma em um canto, equilibram os pólos, a terra e o sistema solar. Não é assim o mundo? Brasil e China. Vitória e derrota. Hambúrguer e rúcula. Morte e vida.

São 7 da alvorada de domingo em Belém do Pará - cidade das mangueiras e de altos índices de lepra, também metrópole do açaí e dos acidentes de carro.

O estudante de medicina Victor Alexandre Miranda, 22 anos - de certo modo bem-nascido, branco e vigoroso -, contempla o sol de mais um plantão, em um mesmo pronto-socorro público no qual dezenas de pretos, pobres e esfacelados mal respiram em macas quaisquer. “É uma lógica de injustiça e discriminação”, pensa ele, para imediatamente se auto-anestesiar, abandonar a filosofia e adentrar na morbidez da prática. “Porque, imagina, se fosse me comover com tudo e de verdade, eu sairia daqui me suicidando e amaldiçoando esse Deus que não existe”.

O Deus por que todos acabam orando mistura, no mesmo liqüidificador de desespero, trabalhadores e bandidos, crentes e ateus, jovens e velhos, homens e mulheres.

No Pronto-Socorro da Av. 14 de Março (no centro da capital paraense), onde faltam profissionais, materiais e equipamentos, o ponto em comum entre os desesperados é justamente a falta de dinheiro. Outras circunstâncias de perfil acabam se aglomerando: têm pele escura, pouca instrução e uma biografia de nenhuma oportunidade para relatar.

Ali, o trabalho de Victor é aprender, suturar, anestesiar, remediar e ver morrer, na medida do possível e do sofrível. Das dezenas de pacientes que chegam instante a instante, uma pequena parte logo se transfere para hospitais particulares; a maioria depende do SUS, e assim se ensangüenta.

São 7 da manhã e o plantão termina. Ele corre pelos corredores desde as 7 do dia anterior. Saldo, além da soma óbvia na carreira e dos choros guardados: Victor Miranda, 22 anos, cheio de gás e de choque, conta a participação em mais de 30 procedimentos de emergência durante a madrugada e o presenciamento de no mínimo 3 mortes.

Sob a experiência dramática de um estudante de medicina, ele calcula que o tempo médio de espera no atendimento efetivo pode ultrapassar 5 horas.

Digamos: é pouco para o resto de uma vida... de quem já está condenado, mas muito para o prolongamento de uma dor... de quem ainda pode ser salvo.

domingo, 9 de dezembro de 2007

Cheiro barato

Em plena movimentação dominical na Praça da República o vendedor Walinson conquistou três minutos de fama. Já imaginou comprar um perfume da Natura para o namorado por apenas R$20,00? Com essa estratégia de marketing ele atraiu a clientela entorno de um carrinho de mão abarrotado de vidros sofisticados e coloridos, de fragâncias famosas.

Kryska, Biografia, Humor. Era só escolher e “não paga para provar a colônia”, dizia o vendedor para espantar a desconfiança da mulherada. Em cada borrifada demonstrativa o ar virou uma mistura de cheiros. “É queima de estoque, vâmo chegando”, dizia. Com notas de R$20,00 entre os dedos ele tentava demonstrar que o negócio estava de vento em popa. Mas a julgar pela apresentação, onde os vidros eram embalados em bandejinhas de supermercado nada elegantes, muitas ainda ficavam com a pulga atrás da orelha.

Demonstrando que sentia a desconfiança que pairava no ar ele se adiantava: “É tudo material avariado, com arranhões ou sem embalagem original. Como não paga imposto é mais barato”, justificava Walinson com o rolo de filme plástico embaixo do braço.

O discurso era coerente e dito com firmeza, mas o pecado de Walinson parecia ser o excesso de confiança. “...tem mais os fiscais não deixam ficar na praça, é muito difícil”, explicava à filha pequena um senhor que passou ao lado do carrinho. Esse comentário adiantava que a carreira de popstar de Walinson seria meteórica.

Preocupado o vendedor já diminuia o tom do discurso ao sentir olhares de reprovação ao redor. Incomodado com a concorrência desleal em frente a sua barraca um ambulante argumentava. “Pôxa cara. Estamos querendo montar a nossa ong para organizar o espaço... O problema é que não pode parar aqui no meio do caminho. Tem que trabalhar da maneira certa”, dizia. “Não esquenta não. Eu já vou sair. No outro domingo vou estar em outro setor”, adiantava. Após essa frase Walinson e o companheiro de vendas (que usava um boné moda skate com a frase: produto oficial licenciado) sairam em alta velocidade com o carrinho.

O sotaque denunciava que Walinson, que aparentava cerca de 25 anos, não era de Belém. Praticamente um forasteiro no comércio ambulante ele contou que é baiano e chegou na capital paraense a pouco tempo. Ele garante que a estratégia continuará a mesma, com preço único de R$20,00 e “durante a semana vou andar pelas ruas do comércio com as colônias”, mas foi embora sem revelar o segredo do negócio.

Por Marta Cardoso

Açaí com Jabá

Chama Verequete

Mike Jagger em Belém-Pará-Brasil